sábado, 21 de julho de 2012

SAUDADE DA ALEGRIA



“Torna a dar-me a alegria da tua salvação...” Salmo 51.12a.

Não, salvação aqui não tem o sentido cristão, lamento muito. Era mais uma questão do próprio reinado. Perder o Espírito Santo, longe de significar o sentido cristão de presença dinâmica, era o que dava a Davi a autoridade de governo. Daí o receio dele ser lançado longe da presença do Senhor. Perderia o que sobrara. Já ficara pelo caminho a sujeira com Bate-Seba e Urias. Só faltava o reinado, e teria ido também, não fosse a oração do Salmo 51.

Não sei se Davi depois disso se tornou uma pessoa alegre, se é que algum dia tenha sido. Agora, que tem hora que a gente tem saudade da alegria, isso tem. Nem sempre ela vai embora por medo, feito Davi que perdera a paz por conta do mal que ainda poderia acontecer. É, Davi estava mesmo apavorado. Pavor do futuro. Ficou olhando este o que fez a alegria sumir, porque a alegria é como uma florzinha, muito, mas muito, delicada. Eu sei que você também acha que ele deveria se juntar à alegria, desprezar o medo e sair pro abraço. Dá a impressão que poderia ter escolhido entre uma e outro, mas é que a alegria às vezes some do mapa. Outra coisa entra na frente, feito muro, e fica de atravessado. Você não sabe se foi avalanche, o que sobra, ou uma ponte caída, o que falta. O caso é que você fica empacado e a alegria vai embora como se escoasse pelo ralo. Não dá tempo de segurar. Essa tal da alegria é frágil demais! Não fica empurrando ou brigando pra encontrar espaço. Ela simplesmente murcha. O profeta Joel um dia disse que a alegria também seca. E como seca! Não briga por nada, porque senão seria fúria, não é mesmo? Ela se recolhe como quem gostaria de ter partido e não foi e daí se esconde. Onde? Pois é, procurar a alegria é um nó. Ela vai se ocultando por detrás das emoções, disfarçada de um modo que ninguém a reconhece. Migra no tempo e vai para o futuro.

É por essa razão que você não deve confiar muito na alegria, quando se trata de passado. Você tem que ficar esperto, porque ela quase sempre idealiza o que foi. Faz você esquecer as coisas duras e ruins e acaba por reinventar dias que não existiram. Isso acontece demais! Daí você fica com saudade do que nunca existiu, parecido com Israel que tinha saudade das cebolas do Egito. Mas como pode isso? A alegria não tem jeito mesmo, quando não some, inventa.

Agora, se você deve ter cuidado quando se trata de passado, com o futuro é completamente diferente. Ela idealiza também, mas daí já é combustível. Ela abre os horizontes, como se fosse cortina em dia de sol e aponta com o dedo pra esperança. Não vai ser sempre assim! Ufa! Que bom! Tem que ter uma saída, não é mesmo? É a porta do amanhã, e assim a alegria e a esperança puxam a gente pra frente. Tem hora que o puxado é arrastado, meio na marra, noutras vezes é ensaboado, liso, que faz a gente escorregar sem freio. Vamos viver! Estamos quase lá! Pode ser uma terra prometida depois de quarenta anos de deserto, um retorno quando terminar um cativeiro de sete décadas, ou um paraíso perdido, que está tanto no passado como no futuro. “Regozijai-vos sempre no Senhor, outra vez vos digo, regozijai-vos” (Fil. 4.4). Não olhe pra mim, olhe pra frente, dizia Paulo. É, eu sei que é triunfalista. Faz a gente esquecer a tragédia da vida, os dramas, as lutas, e Karl Marx que me desculpe, mas não é alienação, é saúde, desejo e confiança. Não é preciso entendê-la, mas ninguém sobrevive sem a alegria. A alegria entende de esperança, e a esperança entende de alegria: “ o choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã” (Salmo 35.5). 

pr. Natanael Gabriel da Silva

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