“Havia em Jerusalém um homem chamado Simeão; homem este
justo e piedoso que esperava a consolação de Israel; e o Espírito Santo estava
sobre ele.” – Lucas 2.25
Eu sei que você já ouvir falar de Teologia Liberal, mas
profecia liberal, acho que é a primeira vez. Pois é, Simeão foi mesmo. Ele
tomou o menino Jesus nos braços e disse, agora posso morrer em paz, porque a
salvação está aqui e a luz chegou para mundo inteiro, e mundo inteiro para ele
não era uma questão geográfica, mas étnica, mais precisamente, o rompimento da
cultura de gueto havida em Israel de que Deus era só pra eles. Tem gente que
acha ainda isso e religiões, denominações, seitas como se fala de uma em
relação à outra pra diminuir a legitimidade, ainda se dizem portadoras da
última condição e possibilidade da posse do divino, Deus nos pertence, com
exclusividade, e para ser redundante, exclusividade única, com fórmulas de
interpretação, celebração e determinação do que seria ou não correto quanto ao
descortinamento do sagrado.
Daí veio Simeão, tomou a criança e disse cantando, a
salmodiar, a musicalizar, e poetou nos dois sentidos da profundidade: uma em
nome do Espírito Santo que não podia ser controlado pela Lei ou pelas regras e se dava como pertencente ao ensimesmamento profético do imaginário religioso, outra na
expressão da arte literária, como letrista e músico, na exteriorização da incompreensível subjetividade que deveria ser traduzida na beleza da adoração, e não podia ser de outro
modo, porque a salvação ali, literalmente em suas mãos, iria libertar até Deus como propriedade do mundo judaico. Iria libertar também a gentalha, mais
conhecida à época como gentios, só que nesse caso seria um libertar pra dentro, chamado
de inclusão. Libertaria também gente que, como ele, aguardava os novos tempos. Libertaria
os oprimidos, a religião do templo e do sacerdócio, e daria à geografia do sagrado
o tamanho do cosmos. Só não libertaria a mãe da dor da perda do filho, que feito espada,
penetraria sem matar, mas matava, pois aquele que nascia já vinha acompanhado da morte
anunciada, porque sofrimento assim, só cura, sofrendo.
É, Simeão é o profeta liberal cheio de contradições, como
toda teologia gestada na liberdade, libertação e liberalidade. Ao apanhar a
vida nas mãos, também dela se despediu como se abraçasse a morte em celebração
(v. 29); depois também sabia que toda liberdade implica em resistência e luta,
incompreensão e perseguição por parte do próprio mundo religioso, (v. 34). E de
fato foi o que aconteceu. E a liberdade entrou para a história em forma de
gente, profecia, celebração e cantoria.
E olha, era só o começo.
Natanael Gabriel da Silva