segunda-feira, 9 de julho de 2012

COISA DE CRIANÇA



“E ele lhes disse: Por que é que me procuráveis? Não sabeis que me convém tratar dos negócios de meu Pai?” Lucas 2.49

Coisa de criança é coisa de criança. A gente observa e ri o riso afetivo como quem vê a cria e se projeta admirado com a vida. As frases depois ficam na cabeça da gente, desde a fala, ainda quando resmungo. Fica ainda o timbre da voz, o tom, e até as expressões faciais que nunca mais serão recuperadas. Saudade gostosa da voz doce e das perguntas, uma atrás da outra, sem tempo de pensar! Brotam naturalmente os por quês. Vão saindo, e não dá tempo nem da gente pensar numa resposta, que lá vem outra pergunta. Uma avalanche de quem tem ânsia de compreender a vida e encaixar tudo certinho. Só que, talvez, crescer seja mesmo um aprender a conviver com perguntas.

Coisa de criança, coisa de um Jesus criança, conversando com doutores no Templo e que ninguém entendeu, ou procurou entender, apenas ouvir: “Não sabeis que me convém tratar dos negócios de meu Pai?”. Que negócios? Que Pai? Tratar do quê? Uma criança, que pouco sabia sobre Pai, que não entendia de negócios e não tinha condições de fazer nada pra cuidar deles. José nem se deu conta ou trabalho de ficar pensando. Esqueceu porque não fazia sentido e nem tinha futuro. Maria, como mãe, também não sabia do que se tratava, mas mãe é mãe, e guardava tudo no coração.

Só que, uma criança no Templo conversando sobre o sagrado, não dava pra entender mesmo. Estava perdida havia três dias, sem pai e mãe, não sentiu falta deles, nem saiu em busca. Uma criança que já entendia que os negócios do Pai não era o comércio ou a carpintaria. Era outra coisa, e o Pai, não era o pai. Jesus criança, no Templo, queria saber mais. Foi procurar respostas, provisórias é claro, porque aqueles sacerdotes, pouco mais de vinte anos depois, encomendariam por trinta moedas a vida dele. Só que isso só foi depois. Naquele dia Jesus fora à fonte fazer perguntas e ouvir, pra depois perguntar de novo. Três dias de conversa, não sei se o tempo todo, mas isso não importa muito. Estar no templo perguntando já era um absurdo. Talvez desejasse saber sobre a Páscoa, já que o assunto de terem ido a Jerusalém fora esse. Qual o significado do cordeiro? O que significou a libertação do Egito? Como foi a nossa história? O que cremos? Como nos tornamos o que somos? Quem foi Moisés? O que significa ser um sacerdote? Templo? O que é um templo? Deus morava ali? Por quê? Desde quando? Foi sempre assim? Perguntas, perguntas, perguntas. Foram essas? Como foram respondidas? O fato é que, duas décadas depois, a própria criança responderia a tudo isso com a vida: o cordeiro daquela festa seria Ele; seria também o libertador, reescreveria a Lei de Moisés, assumiria a condição de sumo sacerdote, o templo seria o seu próprio corpo e o Senhor ira agora morar no coração humano, este sim como lugar sagrado.

Não sei se foi isso, mas poderia ter sido. Só sei que uma criança, orientada e cuidada pelos pais, foi levada um dia pra Jerusalém numa grande festa de libertação, como uma memória viva, quando aparentemente tudo o que povo sofrera era recuperado bem fresquinho na mente e no coração. Começou cedo Jesus, não por conta própria, precisou ser conduzido para depois ir além. E quando aos doze anos disse que deveria cuidar dos negócios do Pai, quem poderia levá-lo a sério? Era coisa de criança que adulto não entenderia jamais, e Maria precisou estar tanto ao pé da cruz, como na ressurreição, pra compreender que, coisa de criança, é coisa séria e que ela, afinal, tinha feito a lição de casa: um dia apanhara Jesus pela mão e o levara a um encontro consigo mesmo.

pr. Natanael Gabriel da Silva

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