“Então, disse Salomão: O Senhor tem dito que habitaria nas
trevas. E eu tenho edificado uma casa para morada e um lugar para a tua eterna
habitação.” 2 Crônicas 6.1,2
Acho que naquele dia Salomão sentiu-se como aquele que
estava salvando Deus da imensidão. Um Deus desabrigado, morador no indefinido,
carente de aparição e adoração e que precisava encontrar um lugar pra reclinar
a cabeça. Se Salomão fosse Deus, teria ficado feliz com a nova casa, cheia de
beleza, grandiosidade, gente e rituais; roupas específicas para as solenidades
e um lugar pra Salomão mostrar aos povos vizinhos a sua nova propaganda de
guerra.
Não sei se Salomão conseguiu tirar Deus das trevas. As
trevas são o enigma do que não pode ser visto. Não se pode falar, nas trevas,
nem de espaço, porque o seu tamanho é o ocultamento e o ilimitado. Nelas é
impossível ver o rosto e ter noção de quem nela se oculta. Mistério Absoluto,
como diria Rahner. Não é um mistério que um dia estará disponível para análise
e observação. É um Mistério sem solução, sem possibilidade de ser desvendado,
compreendido em sua totalidade ou experimentado em toda inteireza. Apenas
Mistério, absolutamente mistério, revelado, primeiramente, por um nome. Nome
que não foi escrito na antiga cultura judaica; só por meio consoantes que
ninguém sabe dizer qual é a pronúncia correta. Um inominável. Nome contrabandeado da cultura grega pelos
escritos do Novo Testamento a partir da causa não causada de Aristóteles, do
motor imóvel, que pode ser aportuguesado por theós, e daí começou o
entrelaçamento da filosofia com a teologia, e também ninguém sabe onde começa uma e
termina a outra.
Por tudo isso, e além disso, Salomão decidiu tirar Deus das
trevas e fez um lugar que já não existe mais. Daí Deus voltou às trevas, e
não há lugar mais próprio, imenso e desconhecido que as trevas do coração
humano. Dizer que Deus é trevas e luz, ao mesmo tempo, significa que uma e
outra são as mesmas coisas. Deus continua desconhecido no interior do
desconhecimento humano sobre si mesmo, e isso é que O torna importante. Ele
continua Mistério, no interior do nosso próprio mistério, para nos dar um sentido
de vida. Diferente de Salomão quando Deus é salvo das trevas, no nosso coração,
é Ele que nos salva do desconhecido. Não precisa ser visto, basta a presença dEle.
Pr. Natanael Gabriel da Silva
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