segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

UM GEROU OUTRO, QUE GEROU OUTRO



“Jacó gerou José, marido de Maria, da qual nasceu Jesus, chamado Cristo.” Mateus 1.16

Pode parecer lugar comum, e talvez você nem compreenda a diferença entre os Evangelhos, mas Mateus começa a narrativa sobre Jesus recuperando o histórico da tribo, um gerou outro, que gerou outro, e assim foi. Lucas começa com a pesquisa. Isso é quase engraçado porque, sendo grego, estava mais preocupado com a exatidão dos fatos narrados, comentados, aumentados, cortados, mitificados e distorcidos nas inacreditáveis conversas que se tinha sobre Jesus nas ruas. Daí resolveu pesquisar. 

Mateus focou no fato de ser Jesus o filho da promessa. Filho da promessa que nasceu numa linhagem de um povo eleito e especial para Deus. Eu sei que o texto de Mateus é nacionalista demais pro nosso gosto. Ninguém hoje iria tentar mostrar que Jesus é o Salvador só por conta de ter sido filho do filho do filho de tanta gente de raça pura. Até porque “raça” é um termo que já está indo embora. Já vai tarde, também concordo, porque em nome da “raça” muita gente matou, diferenciou tipos de pessoas só pelos traços genéticos e daí você vai precisar ler Nina Rodrigues.

Pra mim, que não sou judeu e quase não entendo de raça e gerações, Mateus traz a notícia pelas gerações que Jesus foi, e é, pessoa. Fez milagres sim, andou pela Palestina, conversou e discordou dos imperadores da religião, orientou um pequeno grupo de seguidores mais próximos, entrou em Jerusalém montado num jumento e saiu de lá carregando uma cruz. Pessoa, ser humano, cheio de sentimento e visão de mundo sobre a vida. Pessoa da voz, não deixou nada escrito, porque a vida não cabe num texto. A voz é o discurso da liberdade e não se faz exegese de milagre, só do texto. A vida escapa, os milagres também e a voz anunciada no Monte foi primeiro para o coração, depois para o texto. “Bem-aventurados os pobres de espírito, pois deles é o reino do céu.” Quem estava lá, ouviu, viu a expressão da face, o gesto com os braços, e para quem Jesus olhava diretamente naquele momento, ninguém sabe. Num dado momento declarou parábolas que até hoje são um fascínio, sempre novas e parece que ninguém nunca irá chegar à interpretação única e final; noutros momentos reuniu os amigos e fez longas declarações, verdadeiros tratados teológicos do tamanho da nossa história; versos instigantes que ora você pensa que é poesia, depois vê que é vida e finalmente se vê no texto e entra como personagem pra fazer parte da narrativa, e no semeador que saiu a semear você se dá com as próprias mãos se abrindo para lançar a liberdade, depois descobre que o semeador não deveria ser você, mas fica assim mesmo porque o que fora sentido não pode ser apagado e assim você já entrou na poesia e se viu lá também como chão onde cai a semente e diz: Isso é comigo! Você se torna narrador e personagem ao mesmo tempo; se vê na história e tem saudade de não ter estado lá.

Jesus pessoa, filho do filho do filho.
pr. Natanael Gabriel da Silva

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