“Entrai pela
porta estreita, porque larga é a porta, e espaçoso, o caminho que conduz à
perdição, e muitos são os que entram por ela; E porque estreita é a
porta, e apertado, o caminho que leva à vida, e poucos há que a encontrem.” –
Mateus 7.13,14
Segui à risca a orientação: Natanael, vá de Confins
pra Belo Horizonte de ônibus, lá pegue um táxi pro hotel. E assim foi a corrida mais
curta e mais rápida da minha vida. Ainda bem, porque tive que aguentar um
motorista mal humorado, havia ficado duas horas na fila de espera de
passageiro, e quando saímos a bandeirada de quatro e pouco, teve um acréscimo
de dois e pouco, e o resultado foi seis e pouco. Não tirei a razão dele. É que
o logo ali, quando não se conhece as curvas e os buracos, fica muito distante,
a ponto de não ser possível ver o fim.
Acho que é por essa razão que a porta para o Reino
só é estreita, não tem comprimento, porque não é um corredor. Não é um passar
pela porta e depois ficar sofrendo no túnel claustrofóbico que nunca acaba, e
tem gente que chama isso de vida. Eu sei que esse sofrimento também foi
alimentado pelo cristianismo do investimento, aquele que pensa a existência em
longo prazo, como se o Reino estivesse apenas no fim. Só que não é assim. É por
conta disso que o Reino é como o tesouro que está logo ali. É perto na distância
e no tempo, é um ali, ou aqui, já. Tão aqui e já
que quase não dá pra acreditar que sendo tesouro, e tesouro mesmo, o sujeito só
o encontre quando nele tropeça. Tropeçar é colocar o tesouro ao alcance do
corpo, e tempo o bastante pra apanhá-lo, porque nem dá para pensar, e nem pode. É
uma busca que está no sangue, parece que a gente já conhece, quando vê sabe o
que é e quando se dá conta, já pegou pra si. Parece complicado, mas não é,
porque perto e logo está também a moeda perdida. Está logo ali, debaixo da
sujeira, bem pertinho, e sem dúvida que lá está. Diferente do
tesouro encontrado, quase por acaso, a moeda é uma certeza do que fora perdido, do que
deveria estar em outro lugar e se desmanchou na posse. Caiu, correu, se enfiou
debaixo de alguma sujeira da vida, e vai ser preciso vassoura e tempo esticado de procura, mas é um tempo da certeza do está aqui e sei que vou achar,
pode demorar, mas encontro, ora se encontro. Dentro de casa, minúscula casa de
uma mulher pobre da antiga palestina, com pouco espaço pra procurar, só que o
espaço não é o tamanho do quarto, mas a altura da sujeira, do pó, e de toda
porcaria que foi juntada, e logo dentro de casa, como é que pode isso? Pode,
porque é assim mesmo, o Reino se acha e se perde na intimidade.
Só que complicado
mesmo foi o filho pródigo, que tinha o Reino perto, o tesouro estava ali, não
perdeu moeda, antes achou outras, e foi dar a volta ao e no mundo, como se pra chegar
a um ponto, tivesse ido pelo lado contrário até completar a volta. A sujeira
dele estava noutro lugar, largou o Reino logo perto, e se mandou, perdeu e teve
que voltar, porque sabia onde encontrá-lo. Pro pródigo o Reino não estava no
chão, estava em sua história e vida, centrado na compaixão do pai, e o Reino
não era uma coisa, mas afetividade, presença pura do pai que valia a vergonha
do retorno, e tudo isto é complicado, porque para o pródigo o Reino tinha
ficado, mas também tinha ido com ele, e quando o procurou, o encontrou na memória e
no pertencimento do que havia sido a vida toda e não tinha sequer percebido.
Havia estado dentro do Reino, depois saiu, sem saber o que era, nem o que
seria, mas voltou, porque precisava voltar.
Então, quando alguém perguntar pra você quem é o
próximo e porque o próximo é chamado de próximo, certamente vai se lembrar de
que é porque o Reino está no face a face, e a pessoa que é outro é também você,
porque deve amá-lo como a si mesmo, está posto perto e logo. Quem encontra o
próximo no caminho, pela parábola, se pensar dá a volta, mas se for a ele, apanhará o Reino com as mãos, o colocará num lugar pra ser cuidado, como
se fosse ferido, e não saberá jamais que tudo aconteceu ao contrário, o ferido
e o abandonado era você e foi o Reino que o levou pra ser cuidado, lhe deu
abrigo e pagou a conta, porque você é o outro, e não sabia disso, e aí irá
entender que a vítima da desumanidade e falta de solidariedade é você mesmo, e
quem cuida do outro é como se abraçasse e cuidasse do Reino como
se tivesse vida. E tem.
Então a porta, é só porta. No curtíssimo passo de travessia está o tesouro, o que fora perdido, e o outro, pessoa e próximo. Não tem corredor, apenas
passagem. É um logo perto.
Natanael Gabriel da Silva
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