“Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque
eles serão fartos.” – Mateus 5.6
Essa é a bem-aventurança do sofrimento consciente. Quando
Mateus escreveu o texto, os cristãos sofriam mais que uma perseguição
religiosa: se tornara política. É, perseguição política, ninguém merece. Vem
com a força do poder e deixa de ser horizontal, onde residem os credos
populares construídos no cotidiano, e se verticaliza na brutalidade e
desumanidade dos dogmas ou das leis. Aí não há muito a ser feito, porque as
armas do poder são exatamente aquelas que, rejeitadas, nos tornam cristãos. Foi
por essa razão que Jesus, em muitas ocasiões, saiu de cena e quando foi pra
Jerusalém e entrou no ringue com o poder religioso e político, sabia que
perderia. Só que não perdeu, porque nem o poder político, nem o religioso,
esperavam uma ressurreição. Tem sempre um milagre para além do poder, e que
este não pode ver, porque não tem instrumento pra isso. O poder só sabe olhar
pra baixo.
Pois é, um sofrimento insuperável, mas também a consciência
de que tal sofrimento era injusto. Não é fácil separar a fome e a sede de
justiça da vingança e só quem as possui é capaz de avaliar entre umas e outra.
Um meio-fio que faz diferença, porque quem tem o desejo de vingança é um
infeliz. Não sabe quem é. Não enxerga o outro, nem a si. Tem ódio, não amor.
Tem o desejo de fazer o outro sofrer, mas não que a justiça de fato prevaleça.
É apenas um beligerante perdedor. Um destruidor, porque não quer que a justiça
seja construída, quer apenas a demonstração de que, de algum modo, ele estava
certo. Quem tem fome e sede de justiça não se preocupa em demonstrar que o mal
sobre o outro é importante pra provar a própria retidão. Não, não tem. Quando a
justiça vem sobre o outro, quem tem fome e sede de justiça, chora o sofrimento
de quem um dia o fez sofrer. Não há alegria, do mesmo modo que não houve quando
Jesus, na cruz, suplicou o perdão para quem o agredia por falta de conhecimento
do que estava sendo feito. Jesus foi feliz em dizer isso, mas não o fez com
felicidade.
Então, se você for capaz de sofrer de forma consciente a
injustiça que lhe foi imposta, e depois sofrer de novo por conta da justiça que
recaiu sobre quem o fez sofrer, será um/a bem-aventurado/a. Feliz mesmo, muito
feliz. Porque ser vingativo e beligerante, em nome de Deus ou de qualquer poder,
qualquer um pode. Agora, recolher-se no silêncio e chorar duas vezes, é só para
quem tem um coração singular. Um coração bem-aventurado.
pr. Natanael Gabriel da Silva
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