quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

O SABOR DA PALAVRA




“Porque o ouvido prova as palavras como o paladar prova a comida.” – Jó 34.3

Não foi Jó quem disse isso, mas Eliú. E acho que ele tinha razão, afinal as palavras têm sabor. Uma palavra branda é uma palavra branda, e só ela tem a capacidade de acalmar o coração. A gente se desarma, e tem sempre aquele especialista em primeiro desarmar para depois submeter o ouvinte. Isso é horrível, porque pela palavra alguém é capaz de invadir a nossa mente e desejos. A narrativa da serpente no Gênesis é um ensaio de leitura da alma, do desejo e da sutil invasão: Eva não resistiu. O primeiro capítulo é aberto com o disse Deus, depois disse Deus de novo, outra vez, disse Deus e tudo foi sendo criado, mas quando chegou a vez da serpente, não precisou muito e a palavra a seduziu com magia e sabor da fruta madura, antes de comê-la. Só pela imaginação, ficou sonhando como seria e foi deslizando na direção do que deveria ser proibido e, quando viu, já não havia mais pureza. Só na conversa, na palavra que vai abrindo a alma.

Só que esse não é um bom exemplo. Pode dar a entender que você precisa ser mais prudente, ouvir, avaliar, ficar mais mudo do que deveria, e por aí se vai. Tem hora que é isso mesmo, mas ninguém sobrevive dentro de um castelo que não tem entrada de palavras. Palavras não necessariamente sonoras, evidentemente, escritas ou que estão nos gestos, na arte, ou no modo como em determinadas situações alguma coisa fala por si.

As palavras têm certa magia, se me permite essa expressão. Tem um sobrenatural que nos aproxima, ou distancia, e pode ser doce ou amarga, preconceituosa ou afetiva, simples e humilde ou prepotente e impositiva. Não importa: só a palavra branda desvia o furor. A outra, aquela que é amarga, preconceituosa ou prepotente, cria abismos, e em alguns casos sequer dá pra construir pontes.

Uma palavra amiga, dirigida a alguém com um sorriso, que já vem doce, pode fazer muito bem a quem está próximo/a de você. Pela palavra, nas suas múltiplas formas, você se dá num Continente, amplo e aberto, ou numa ilha, só para usar as metáforas de Erico Veríssimo.

pr. Natanael Gabriel da Silva

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