domingo, 12 de fevereiro de 2012

O ROSTO DE DEUS




“...porquanto tenho visto o teu rosto, como se tivesse visto o rosto de Deus...” Gênesis 33.10b

O rosto de Deus, e o mais próximo do que se pode ter ideia é no rosto de alguém. O rosto de Deus não está nos conceitos dos livros, dos textos que tentam desvendar os mistérios e ficam dando volta em círculos, de perímetros cada vez mais longos. São as andanças da imaginação. Anda-se muito e o cansaço parece indicar que já se está quase lá. Nem quase, nem lá, porque pra ver o rosto de Deus, só quando você se deparar com o outro em estado profundo de generosidade e afeto. Só a vida é capaz de fazer a leitura da vida.

Estava pensando nisso e tentando encontrar um caminho que direcionasse uma resposta: Qual a razão de, provavelmente, não haver no Antigo Testamento a preocupação com a existência de Deus? Talvez seja pelo fato da existência não ter rosto. Objetos existem e não têm rosto. Objetos existem e são qualificados pela sua utilidade. Existir não significa amar nem perdoar. Existir é só existir. Agora, o “Vive o Senhor, Deus de Israel, perante cuja face estou...” só pode ser afirmado pelo profeta que, de certo modo, viu o rosto de Deus. O “vive o Senhor” é a expressão do reconhecimento de sua autonomia, não apenas um existir, mas possuir vida em si mesmo, por direito de criação e invenção. O Senhor não apenas existe, Ele vive.  O “Deus de Israel”, do oráculo, se relaciona à memória de sua ação em favor de um povo. Se fosse só existência não acompanharia ninguém, não libertaria quem quer que fosse e nem sequer vislumbraria um jardim, não haveria ser humano, porque este é vida. O “Deus de Israel” então acompanhou, cuidou, fez-se presente e deu-se como presente a quem não merecia. Tinha, e tem, um rosto. Agora, o “perante cuja face estou...”, é, sem dúvida, pessoal. Só eu vi e sei, dizia o profeta. Sei por ter estado lá, vi quem Ele é, e sei o que me disse, e agora eu só estou aqui para falar em nome dele. E soltou Elias o oráculo profético que se cumpriu ponto por ponto, não choveu e nem orvalho caiu, tudo ficou seco, porque só Deus controla a vida, e quem vive, não apenas existe, tem rosto.

Jacó olhou para o irmão e viu nele uma profunda ingenuidade e incompreensível generosidade e só conseguiu afirmar: “...porquanto tenho visto o teu rosto, como se tivesse visto o rosto de Deus...” Esaú não entendera os presentes, sequer sabia do que se tratava e esquecera tudo, de esquecimento provocado. Coisa de Deus mesmo: esquecimento não por conta da tentativa de esquecer a dor, mas lembrar-se do perdão; não motivado em benefício de si próprio, mas para libertar o outro. Esquecimento e abraço, simplicidade e incapacidade de compreender o mal arquitetado por Jacó, que tentara manipular e constranger Esaú para um perdão obrigatório, vendido e comprado, numa associação doentia parecida com um acordo político. Esaú não entendia de política, mas de pastoreio. Não dava valor aos presentes, mas à pessoa do irmão. Não entendeu porque não quis entender, olhou viu, mas não viu, porque o rosto de Deus tem esse quê de saber tudo e perdoar tudo. Pode até sofrer, mas o mais importante é perdoar.

Esquecimento provocado, você já tinha pensado nisso? Pois é, ele só pode vir na esteira de um não entendimento também provocado, consciente, desejado e efetivado: Não quero compreender, mas já tendo compreendido. Se você não compreende como isso é possível, eu também não. E fica assim, porque esse é o rosto de Deus.

pr. Natanael Gabriel da Silva

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