sábado, 18 de fevereiro de 2012

FESTAS E FESTAS

“A Festa dos Pães Asmos guardarás; sete dias comerás pães asmos, como te tenho ordenado, ao tempo apontado no mês de abibe; porque nele saíste do Egito...” – Êxodo 23.5a,b,c

Era assim no tempo do Israel antigo: a memória da presença de Deus se dava, comunitariamente, pelas grandes festas nacionais. Muita celebração. Eram dias em que a comunidade parava para relembrar os feitos do Senhor na história. Não é difícil imaginar os mais idosos, segundo as suas tribos, narrando e contando os feitos dos antigos. Como não havia texto, nem forma de registro, o relato era oral, envolvia a paixão de quem falava sobre o que Deus fizera, desde os tempos de Abrão, que se tornou Abraão, e que lá nos primórdios havia estado naquela mesma terra que agora ocupavam. Falava-se de como o Senhor um dia o protegeu na angústia da noite. Tudo em detalhes, e o diálogo entre o Senhor e Abraão terminou com um ato de adoração; o adorador passeando pelo meio do sacrifício e uma promessa: é preciso olhar as estrelas para se conhecer a proteção e a história de um povo. Não, não se tratava de astrologia, apenas metáfora de proteção. Afinal, quem é o ser humano diante das estrelas? Assim iam narrando os mais velhos e mostrando aos mais jovens as mesmas estrelas vistas por Abraão. Contavam da promessa: aquele povo seria inumerável como as estrelas do céu.


Depois continuavam a narrativa e descreviam os tempos de Isaque e de Jacó, o Egito, o sofrimento, que toda a memória tem que ter, e o deserto. Quanta coisa havia acontecido no deserto! Falavam dos que não puderam entrar na terra prometida, de como Moisés descera do Monte com as tábuas da Lei e a multidão de libertos caminhando apenas na direção da terra que prometia muito, nela era como se, do chão, vertessem o leite e o mel. Tudo falado, narrado e compartilhado. Narrativas e narrativas sobre o relacionamento incompreensível entre Deus e seu povo. Caminhada, muita caminhada. De parada em parada, quarenta anos caminhando, e todos os dias o inexplicável Maná. E as palavras fluíam, as imagens iam sendo construídas na memória dos ouvintes, tendo o Senhor como centro de tudo. Eram festas de promessa e obediência, um reviver a história para que os mais jovens pudessem visitá-la com o coração e imaginação. E tinham muito que contar. Histórias de uma Arca que um dia navegou sozinha na imensidão de um único oceano, cheia de animais e nunca ninguém conseguiu explicar como isso foi possível. Só que a questão nunca fora o da possibilidade, mas do sobrenatural. O impossível, longe de ser um atestado de falta de veracidade, era confirmação de que o que não pode ser compreendido torna o mistério mais misterioso. Não era só a Arca que fascinava, mas também a impossibilidade de se compreendê-la. E o Mar Vermelho se abrindo? Precisa saber como isso foi possível? Claro que não, pois a história é da libertação do povo, e o mar era apenas o caminho. Importava o milagre, pois pra colocar um povo na trilha, Deus é capaz até de abrir os mares. Daí os olhos grandes e a imaginação corria solta pra tentar ver um mar, feito muralha, e a liberdade caminhando com os pés enxutos. E assim seguiam as sagas repetidas e repetidas, mas sempre novas, instigantes, apontando para o futuro: foi assim que Deus fez e é assim que fará outra vez. No ano seguinte tudo era repetido, contado e revivido, e a notícia chegava como se tivesse sido a primeira vez. Respiravam os feitos do Senhor que eram traduzidos em forma de adoração e gratidão. Era o que podiam dar ao Senhor: preservar a memória de Sua Presença.


Festas e festas, e cada um dá o que tem. Para a sociedade do nosso tempo, que se esqueceu de Deus, não é possível esperar muito.

Pr. Natanael Gabriel da Silva

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