domingo, 18 de novembro de 2012

AO MEU AMIGO, COM CARINHO


Pastor Laurencie Salles Coelho,
boletim da Igreja Batista em Barão Geraldo, 18 de Novembro de 2012,
pelo transcurso do 30º. aniversário da minha ordenação pastoral.

 
“Mas em nada considero a vida preciosa para mim mesmo, contanto que eu complete minha carreira e ministério que recebi do Senhor Jesus, para dar testemunho do evangelho da graça de Deus”. (Atos 20.24) 

Como medir o significado de 30 anos de ministério pastoral?! Como expressar em poucas palavras a profundidade de tal vocação? Devo admitir: é praticamente impossível fazer isso e qualquer tentativa nessa direção corre sério risco de cometer tremendas injustiças e ainda de ser superficial. Mesmo sabendo de tudo isso, ousarei, com toda humildade, correr esse risco. 

Não é novidade pra ninguém que nos dias atuais o mundo é marcado por consumismo exacerbado, e até mesmo a igreja foi engolida por uma visão mercadológica, inclusive o ministério pastoral. É por isso que tantos confundem a figura do pastor com a de um empresário, e pretendem, em não poucos casos, analisar a atividade pastoral através de estatísticas e números. Além disso, a linguagem utilizada para pensar na missão do pastor é mais fundamentada na literatura de auto-ajuda, que trata de sucesso, fama, poder, do que nas Escrituras Sagradas que fala de amor e serviço. Nada mais tolo e longe da verdade! 

Como se pode perceber existe tantas vozes, tantas visões sobre ministério pastoral, tantas opiniões e tantos paradigmas que fica difícil discernir o que é verdadeiro. Por isso, estaremos focados no NT. Afinal, ele tem o poder de “desalienar” e firmar os pés no chão. 

Em Atos 20, Paulo está indo em viagem para a cidade de Roma onde vai ser julgado por César e passa por Éfeso. Vive ali um momento de despedidas, lágrimas e saudades e também de orientações e direcionamentos para os anciãos da igreja. E nesse momento tão especial, todo marcado por emoções e sentimentos de comprometimento humano, Paulo explica com muita clareza o sentido da sua vida – servir a Jesus, testemunhando o evangelho da graça de Deus (ver verso 24). Essas palavras de Paulo caem como uma luva no sentido de guiar nossa compreensão da profundidade, da beleza e da complexa tarefa do ministério pastoral. 

Basicamente a missão do pastor é dar testemunho do evangelho da graça de Deus em tudo o que faz. E só pode testemunhar dessa graça quem a vive e a pratica constantemente. Testemunhar do evangelho não é só proclamá-lo através da pregação e da evangelização. De que adiantaria querer dar aos outros, algo que não se tem?! OU, de que adiantaria pregar uma coisa e viver outra? Aliás, falar de Jesus ou sobre Jesus é muito mais fácil, ainda mais nos dias de hoje que ser evangélico está na moda, difícil, contudo, é seguir seus passos, assumir os seus valores, imitar suas atitudes e viver sua graça. Testemunha-se do evangelho da graça por meio dos relacionamentos construídos em profundidade, das orações de intercessão, das conversas de aconselhamento, nas visitas aos hospitais, estando perto de gente sofredora, ajudando a resolver problemas familiares dos outros, pregando, cantando, enfim, servindo com alegria no coração de cooperar com Deus. Tudo isso impulsionado pela bondosa mão divina. Graça do começo ao fim. Graça para começar, andar correr, voar e graça para parar quando for o tempo adequado. 

Por isso proponho que os ministérios pastorais sejam avaliados não pela idolatria dos números, nem mesmo pela linguagem empresarial do sucesso, nem pelas lentes dos paradigmas da auto-ajuda. Mas tão somente pela capacidade de comunicar a graça de Deus, vivendo na simplicidade do Evangelho junto com um monte de gente que também carrega no seu coração o anseio por Deus. Quem teria condições de avaliar essas coisas?! Quem tem os instrumentos certos para medir a intensidade do amor?! Quem consegue contar as lágrimas de um ministro do Senhor?! Quem pode enumerar as noites mal dormidas por conta de preocupação e stress?! Quem pode registrar as palavras de benevolência ditas ao longo de 30 anos?! Quem pode contar os abraços de perdão de perdão e amizade?! Quem pode quantificar os aprendizados no contato intenso com a Palavra de Deus?! Só Jesus mesmo que é o Senhor dos ministérios para entender com propriedade o significado disso tudo e avaliar com justiça e misericórdia o trabalho pastoral, que é absolutamente denso, tenso e intenso. 

Não tenho nenhuma dúvida que a maior tarefa do pastor é comunicar a graça de Deus às pessoas. Só isso e tudo isso. Seja num seminário no Rio de Janeiro, numa universidade em São Paulo ou numa faculdade em Campinas. Seja numa igreja no vale do Ribeira, em Sorocaba ou em Barão Geraldo. Seja numa igreja grande, seja numa igreja pequena. Seja pra muitos, seja para poucos. Não importa o lugar, importa sim, a disposição do coração de servir a Deus e às pessoas graciosamente, custe o que custar. 

Louvamos a Deus por sua vida, amigo Natanael, por sua disponibilidade de comunicar, em tudo que faz, a graça de Deus. A Bíblia diz: “a quem honra, honra” (Rm 13.7), por isso não nos constrangemos por agradecer a Deus por sua história de vida e seus 30 anos de ministério.  Que Deus o abençoe hoje e sempre. Amém. 

Laurencie, seu aluno, irmão e amigo.

Transcrito por Natanael Gabriel da Silva

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

A PRIMEIRA MENSAGEM




“Em qualquer casa em que entrardes; dizei primeiro: A paz esteja nesta casa.” Lucas 10.5

Coisa que o cristão ainda não aprendeu: é o portador da mensagem de paz. Só que virou outra coisa, e faz tempo. Não há pregador que não se veja como profeta, e atrás do profeta, a palavra de condenação e direção. Também não há pregador que não se coloque como sacerdote e assim se dá como intermediário. Por um lado, a palavra profética final, pelo outro, a ocupação de uma função onde só cabe um. Daí não há como escapar:  uma única e exclusiva recomendação, por apenas um que pode recomendá-la. Bem, o resultado é o pastoreio profético-sacerdotal, que não é pastoreio, mas apenas uma tentativa de atualização tribal.

Nada disso. A primeira mensagem do pastoreio é a paz. A comunidade cristã só se coloca pastoreando o mundo, quando é capaz de dialogar, disseminar e permear o humano com a paz. Paz que se constrói, porque a expressão, “a paz esteja nesta casa”, é um convite para que o outro seja incluído no pastoreio da paz. Não é uma paz que se dá unilateralmente, como uma imposição, ou você aceita a minha paz ou vamos entrar em conflito; claro que não é isso, mas é o que mais se faz. É uma construção com o outro humano que se propõe a conviver pela paz, para juntos, construírem uma nova paz, que se amplia no processo de inclusão. Uma espécie de contágio: a fileira da paz vai crescendo, porque os incluídos se tornam agentes da paz. Nem quando a paz é rejeitada, esmaece. Não existe paz pela metade, nem mesmo quando o pacificador anuncia o "a paz esteja nesta casa" e esta é desprezada. O pacificador a recolhe, a abraça e sai à procura dos que almejam e desejam viver em paz, pois a paz não consegue vencer aquele que não a prefere, pois pra vencer, se tornaria em princípio de guerra, o que é uma negação de si mesma. A confiança da paz é que sempre haverá alguém com o desejo de recebê-la para trilhar um novo sentido de vida. E ela está certa. 

A primeira mensagem, a mais importante, e a que faz mais sentido no pastoreamento do humano: “A paz esteja nesta casa”. 

pr. Natanael Gabriel da Silva

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

BEM-AVENTURADOS OS PACIFICADORES


“Bem-aventurados os pacificadores, pois serão chamados filhos de Deus.” – Mateus 5.9

Talvez a paz seja um sonho agudo do cristianismo. Quem for pobre de espírito, herdará o reino do céu (Mateus 5.3), que é ótimo. Quem chorar receberá o pastoreio do Senhor (Mateus 5.4), que já não é uma promessa de “lugar” (Reino), mas de profundidade da alma, e isto é inigualável. Quem for humilde, herdará a terra (Mateus 5.5), coisa que, pelo esforço e sonho, todo o judeu sabia o que significava peregrinar em busca da Terra Santa, e herdar a terra é um enorme presente. Quem tiver fome e sede de justiça, será saciado/a (Mateus 5.6), e nunca mais ter fome e sede até parece um sonho, especialmente quando a miséria se torna o problema da existência. Quem for misericordioso, encontrará a misericórdia para si (Mateus 5.7), que é o retorno de quem se compadeceu a miséria do outro. Quem for limpo de coração, vai ver a Deus (Mateus 5.8), uma experiência única, como se fosse possível ser um Isaías do capítulo 6. Agora, só o pacificador, se torna filho de Deus.

Tornar-se filho de Deus é ter a natureza de Deus, como se fosse um código de filiação que passa de pai para filho, na condição de marca ou traço. Não é algo que se possa ter o controle, não é um lugar que se herda, ou um Reino onde se habita. Também não é ver a Deus, ou ter os dramas da vida equacionados por Ele. Tudo isso é indizível, não tem tamanho, não pode ser medido, nem mesmo pensado. Contudo, ter a natureza de Deus, como se fosse uma marca biológica que se faz presente e influencia as gerações seguintes da própria vida, esta condição, é dada apenas ao pacificador, porque Deus, é  Deus de paz.

Não tome, portanto, como exemplo de fé e determinação, a luta história de Israel e sua conquista da terra, quanto tanta gente morreu, incluindo mulheres e crianças, e basta ler os primeiros capítulos do livro de Josué para conhecer, ou revisitar, a história. Aquela foi uma religião que não deu certo. Nada de beligerância, nem conflito, nem guerra. Paz, somente paz. Nada de utilizar o discurso profético como recurso de discórdia e imposição da própria vontade. Não. Nem tomar como regra o inconformismo de Jesus no Templo diante dos cambistas. Nada disso. Tome a cruz, e siga Jesus. Tome o deixo-vos a paz a minha paz vos dou. Ou o vós sereis os meus discipulos, e todos verão isso, se vos amardes uns aos outros. Ainda a crucificação, quando Jesus, sem qualquer sentimento de vingança, disse ao Pai: Pai perdoa-lhes porque eles não sabem o que fazem. O cristianismo é, antes de tudo vivência de paz, fraternidade, inclusão, sem qualquer sombra de desumanidade ou preconceito.

É difícil? Claro que é difícil! Ser pacificador é muito difícil. É mais fácil agredir, se impor, defender o espaço, e dar-se como vencedor naquilo que julgou ter sido uma batalha. Isso é tão fácil que não há necessidade nem de esforço, basta o ímpeto e o agir espontâneo. Agora, se você conseguir ser um pacificador, e isto significa o esforço para ser diferente e conter a desumanidade que o ser humano possui no coração, terá o rosto de Deus (Gênesis 33.10) e será a própria herança do Senhor, um filho.

Pr. Natanael Gabriel da Silva

 

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

BEM-AVENTURADOS OS LIMPOS DE CORAÇÃO



“Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus” – Mateus 5.8

É, ser limpo de coração não é nada fácil. Eu sei que tem a ver com o ter sido purificado, perdoado e relançado na vida pra um reinício. Só que está também relacionado ao histórico, ao que se constrói. Na linguagem cristã, não basta fazer o certo, do modo certo, é preciso antes de tudo avaliar as intenções e os desejos. Só que não são apenas as intenções e os desejos que legitimam uma ação. Claro que não. É a tal da justiça que deve exceder, e o que está em discussão são os valores de amor, fraternidade, perdão, ou, seguindo as recomendações anteriores, ser pobre de espírito, suportar as profundas adversidades, responder com mansidão, desejar a justiça sem vingança e dar-se como misericordioso. Isto é, distribuir, ensinar, viver e respirar a misericórdia.

O ser limpo de coração é um problema, porque uma vez marcado, marcado para sempre. Arrependimento vai, arrependimento vem, perdão vai, perdão vem; justificativas para se ter feito uma coisa ou outra também vão, e junto o histórico de relacionamentos. Este é parceiro da lógica, bem estruturada, e que fundamenta o que foi feito como necessário ou natural. Só que a marca, é a marca, e a memória registrará o evento como um alerta para os dias futuros. É difícil, porque culpas: quem não as tem? Ter feito alguém sofrer, quando deveria ampará-lo/a, quem já não fez isso? E a infidelidade? Tanto pra quem doeu, quanto pra quem fez doer, é dura não é mesmo? E um dia lá vem o sentimento ilhado, morto e amordaçado (Fagner) e emerge num momento vivo, como se tivesse sido ontem. Você vai precisar desta lembrança para ser pessoa, não vai deixar de ver a Deus por conta disso, mas vai ter que conviver com a memória só pra saber que é humano, perdidamente humano.

É, a limpeza do coração vem como uma recomendação: cuidado com a vida, os eventos e as pessoas passam, mas tanto a memória como a consciência, não podem ser transferidas. Não é fácil ser assim. Exige escolhas. É uma construção que não pode ser demolida. Difícil, muito difícil. Agora, quem consegue, é feliz, muito feliz, é bem-aventurado.

pr. Natanael Gabriel da Silva

sábado, 20 de outubro de 2012

BEM-AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS


“Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia.” Mateus 5.7

Misericordioso é aquele que, não sendo alvo da misericórdia, desencadeia a partir dele os atos de misericórdia. Como se fosse fonte. Pois é simples, de certo modo, ser apenas condutor, porque a maioria de nós é apenas canal por onde passa o amor, e só sabemos responder com o amor quando somos amados. Saber responder até que dá, mas movimentar o que não foi recebido e ensinar um caminho ao impiedoso, que este não conhece, não é nada fácil. É como aquele princípio que nos mostra que as virtudes não podem ser dirigidas. Alguém não pode ensinar o outro a odiar determinadas pessoas e ao mesmo tempo selecionar a quem deve ser direcionado o amor, porque são princípios de vida. Ensina-se a amar, e quem aprende ou convive com a virtude do amor e é embalado por ele, distribui e é tomado por uma ingenuidade incompreensível. Difícil, eu sei. Quase um sonho, mas é assim que funciona.

A ingenuidade do misericordioso, que pela misericórdia, tenta ensinar o agressor que há um caminho melhor, é sofrida demais. O misericordioso não pode impor a misericórdia, porque isto a corromperia. Também não pode exigi-la porque não depende de uma determinação, mas de um modo de vida. E modo de vida se ensina com o modo de vida. Só que o misericordioso tem o lastro e a paciência da espera. Receberá misericórdia, um dia sim. É a esperança que não o faz desistir. Não é porque não saiba fazer diferente, nem pelo fato de concordar com a opressão, e muito menos por sentir-se culpado de não ter sido contundente e agressivo quando dele foi requerido. Não há culpa. Apenas esperança. Não é retroalimentado, como se a misericórdia batesse e voltasse. Tem apenas uma direção. Não é apenas um canal de misericórdia, é fonte. Nasce nele e sai para o outro.

Amar sem ser amado/a, responder com paciência quando a própria natureza humana indica outra direção, e não permitir que o mal do outro contamine a virtude da misericórdia que se possui, é muito difícil. Dificílimo. Coisa que nem o superlativo dá conta. Agora, se você conseguir, será feliz, mas muito feliz. Será um/a bem-aventurado/a.

pr. Natanael Gabriel da Silva

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

BEM-AVENTURADOS OS QUE TÊM FOME E SEDE DE JUSTIÇA


“Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos.” – Mateus 5.6

Essa é a bem-aventurança do sofrimento consciente. Quando Mateus escreveu o texto, os cristãos sofriam mais que uma perseguição religiosa: se tornara política. É, perseguição política, ninguém merece. Vem com a força do poder e deixa de ser horizontal, onde residem os credos populares construídos no cotidiano, e se verticaliza na brutalidade e desumanidade dos dogmas ou das leis. Aí não há muito a ser feito, porque as armas do poder são exatamente aquelas que, rejeitadas, nos tornam cristãos. Foi por essa razão que Jesus, em muitas ocasiões, saiu de cena e quando foi pra Jerusalém e entrou no ringue com o poder religioso e político, sabia que perderia. Só que não perdeu, porque nem o poder político, nem o religioso, esperavam uma ressurreição. Tem sempre um milagre para além do poder, e que este não pode ver, porque não tem instrumento pra isso. O poder só sabe olhar pra baixo.

Pois é, um sofrimento insuperável, mas também a consciência de que tal sofrimento era injusto. Não é fácil separar a fome e a sede de justiça da vingança e só quem as possui é capaz de avaliar entre umas e outra. Um meio-fio que faz diferença, porque quem tem o desejo de vingança é um infeliz. Não sabe quem é. Não enxerga o outro, nem a si. Tem ódio, não amor. Tem o desejo de fazer o outro sofrer, mas não que a justiça de fato prevaleça. É apenas um beligerante perdedor. Um destruidor, porque não quer que a justiça seja construída, quer apenas a demonstração de que, de algum modo, ele estava certo. Quem tem fome e sede de justiça não se preocupa em demonstrar que o mal sobre o outro é importante pra provar a própria retidão. Não, não tem. Quando a justiça vem sobre o outro, quem tem fome e sede de justiça, chora o sofrimento de quem um dia o fez sofrer. Não há alegria, do mesmo modo que não houve quando Jesus, na cruz, suplicou o perdão para quem o agredia por falta de conhecimento do que estava sendo feito. Jesus foi feliz em dizer isso, mas não o fez com felicidade.

Então, se você for capaz de sofrer de forma consciente a injustiça que lhe foi imposta, e depois sofrer de novo por conta da justiça que recaiu sobre quem o fez sofrer, será um/a bem-aventurado/a. Feliz mesmo, muito feliz. Porque ser vingativo e beligerante, em nome de Deus ou de qualquer poder, qualquer um pode. Agora, recolher-se no silêncio e chorar duas vezes, é só para quem tem um coração singular. Um coração bem-aventurado.

pr. Natanael Gabriel da Silva

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

BEM-AVENTURADOS OS MANSOS


 “Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra.” Mateus 5.5

O contrário de manso é ser violento, nervoso, comportar-se com brutalidade, em atos ou sentimentos. Semelhante é aquele que é calmo, gentil, amigável, paciente, afável. Alguém que se coloca na condição de servo e que só deve a obediência ao seu senhor. E isso é difícil, ora se é. A violência é mais fácil, e o desejo de responder à altura sai liso, rápido e certeiro. Naturalmente o ser humano responde deste modo, e quando pensa que não deveria fazer, já fez. É um ponto, uma resposta, sem futuro ou espera, como um pingo. Daí a mansidão ser singular porque tem que ser paciente. Não acontece de um momento pro outro, nem tem resultados imediatos. Na verdade, quando se exerce a mansidão, não se deve esperar qualquer resultado, porque pode frustrar quem não encontra a resposta do ter sido, ou cansaço do nunca chegar. A mansidão não se resolve com uma mudança de cenário histórico, e quando o fato se esgota, a mansidão não termina porque não está associada a um evento, mas à pessoa. Vão se alternando os dias, as coisas vão se modificando, e o paciente é tido como quem não age, não faz, não se importa ou não vê. Ledo engano! Quem exerce a mansidão não tem pressa, não faz uso da força que possui, nem lamenta a fraqueza de ter sido vencido. É, tem gente que se dá como possuidora de mansidão, mas confunde isso com a falta de coragem ou recursos, pois se os tivesse, há muito as coisas teriam sido resolvidas de outro modo. Só que, quem faz a opção pela mansidão, se comporta de forma voluntária.

Um dos detalhes mais interessantes da parábola do joio e do trigo é o ensino da mansidão. Espere. Só espere. Esperar quanto? Esperar até o fim, lá no final, bem no limite, quando então um e outro serão separados, mas não faça por si, nem agora, nem amanhã, espere, nordestinamente espere. Espere o Reino dado. Você não o conquistará mediante a força. Na verdade não o conquistará de nenhum modo. O Reino é herança.

É difícil esperar. É difícil suportar. É muito difícil não corrigir o que deve ser corrigido, porque desde sempre aprendemos que a voz profética tem que ser aguda, imediata, declaradamente condenatória e corretiva; imediatamente já. É difícil saber esperar, aguardar o tempo de maturação, porque a demora pode consolidar a perda e o desterro. Pois é, pode, mas não necessariamente. Ensinar a vida com a mansidão, consciente do mal, tendo suportado o sofrimento por conta dele, mas deliberadamente assumir o prolongamento do tempo como cura, não é pra qualquer um. Agora, se você conseguir, será um/a bem-aventurado/a. Muito feliz, superlativamente feliz.

pr. Natanael Gabriel da Silva