segunda-feira, 25 de junho de 2012

DUAS MULHERES


Quem teve coragem de ungir os pés e a cabeça de Jesus? Quem? Duas mulheres, apenas duas mulheres. Uma que acrescentou ao perfume, as lágrimas. Jesus entrou e ela o fez entre homens letrados nas Escrituras. Tornou-se conhecida apenas como “pecadora” (Lucas 7.36-38). Ela não pediu nada, não esperou um milagre, não perguntou sobre alguma dúvida, tipo, quem vai se casar com quem na eternidade? Infantil demais! Uma mulher, que não era santa, não fez promessas, não pediu cura e nem filho. Era tão pecadora que se deu como indigna pra falar qualquer coisa (Ah, se eu quiser falar com Deus...); fez o que fez porque quis fazer, entrou e saiu de cena muda e foi perdoada pela atitude. Diferente, né? Pra nós que entendemos a confissão como uma declaração explícita, um perdão assim parece pouco comum. Não é verdade que Jesus nos surpreende de vez em quando?
Depois foi a vez de Maria. Outro vaso de alabastro, cheio de unguento caríssimo, outra mulher sem desejo ou exigência. A mulher Maria, que João coloca antes da entrada de Jesus em Jerusalém, foi e ungiu-lhe os pés. Se for isso mesmo, Jesus teria entrado em Jerusalém purificado do seu primeiro ministério e caminhado no espaço do sagrado, a Santa Cidade, como manda o figurino: sem poeira nos pés. Mateus e Marcos colocam o evento antes da instituição da Ceia, o que parece mais próprio, só que mencionam a unção sobre a cabeça. Foi perfume que escorreu pelo corpo inteiro. Sem dúvida, uma preparação para o sacrifício; sofrimento aliviado e corpo ungido, não por um sacerdote, mas por uma mulher.

Um ato de delicadeza. Eu sei que vai parecer machista demais, mas uma mulher fina, é uma mulher fina. Elas fizeram o que ninguém pensou e foram duas só pra mostrar que não foi por acaso. Não foi acidente de percurso, nem um evento perdido. Foi simplicidade, isso sim. Pureza também, que só um sentimento de maternidade poderia explicar. Maria, ao que parece, não sabia que o filho da humanidade seria crucificado, mas quem é que pode adivinhar qual será o melhor momento para a liberação do afeto? Ali tinha gente pra muita coisa. Uns queriam fazer planos financeiros pros pobres, outros, talvez, desejassem saber mais do discurso que Jesus fizera no Templo. Se você estivesse lá, o que iria preferir: ouvir ensinos de Jesus ou ungi-lo com perfume? No meu caso, literalista e acadêmico, postulante a aprendiz de Ciências da Religião, iria ficar fazendo perguntas sobre o que ele quis dizer com a expressão “Filho do Homem”, por exemplo. Iria querer saber onde entraria o profeta Daniel e em que sentido, e ainda fuçar sobre as parábolas, somar virgens com servos e talentos. Perguntaria se não dava pra explicar um pouco mais sobre esse negócio de castigo eterno. Eu iria ficar feito repórter querendo saber de tudo, uma resposta suscitaria outras perguntas e a corda não teria fim. Jamais iria pensar em perfume! Só que tinha também os do outro lado, os que pretendiam matá-lo. Gente se aproximando, olhando-o meio de canto, aguardando a ocasião. E em meio a tudo isso, uma mulher se preocupou com ele, Jesus, só com ele. Em silêncio, e o perfume era dela e Judas não tinha a ver com aquilo. Trezentos denários, numa avaliação de sobrevoo. E quem avaliou, em seguida, trairia Jesus por menos da metade. Era um homem.

Perfumes nos pés, na cabeça, escoando pelo corpo inteiro, quase um ano de trabalho derramado de uma vez, só pela disposição de agradar, sem pedir, exigir, querer, trocar, ser admirada ou reconhecida. Nada disso. Apenas derramar. Derramar com sobra, com sensibilidade, riqueza e poesia.

Daí eu pergunto: Não tinha que ser mulher?

pr. Natanael Gabriel da Silva

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