É aqui vai o
que Jesus nunca disse: Vamos orar. O vamos orar só é válido, se for um vamos
imediato, ou se colocado como determinação e convicção, expresso por meio de um
sentimento de preocupação e desejo de busca. Não é a esse vamos orar que me
refiro. Trata-se daquele que é dito de maneira vaga e é colocado num futuro sem
tempo e já se dá como vazio logo na
pronúncia.
Esse vamos orar tem cheiro de encerramento de diálogo
com uma pitada de espiritualidade perdida. Já a ouvi no sarcasmo da ironia, no
limite da discordância, quando os argumentos se tornam inconclusos, daí o que
discorda olha e diz entre os lábios o que não acontecerá: Vamos orar, ou, vou
orar por você. Não vai orar, é apenas uma sugestão de desvio, apontando que há
um descaminho no modo de se compreender teologia e vida com Deus pelo
interlocutor, e então o vamos orar sobre isso ou aquilo aparece como uma pérola
de mal gosto, colocada como fim de frase, diálogo e bloqueio de qualquer
argumentação, como se aquele que promete, cuidadoso fosse.
Jesus disse o vou ali orar e foi, mas aquele vamos orar, não.
Nunca disse porque não colocava no futuro a dor, nem a solidariedade. Era no
ato, no já, no agora instantâneo, feito e confirmado pelo milagre, e quando
disse pra Lázaro sair do túmulo não foi uma oração projetada no futuro, um
depois que em alguns casos nunca chega, foi na verdade no contexto do profundo
sentimento, presença de todos e a oração saiu com um eu sei Pai que sempre me
ouves, e não ficou pra depois, nem pra daqui a pouco, mas no já. E estava
feito. Ao leproso disse o eu quero, sê limpo! Disse e fez, na hora, quero
agora, já, não quero pra depois, nem pra amanhã.
O vamos orar, esquecido depois de dito, anunciado como
esperança que não se concretiza, promessa que nunca chega, não serve. Se
ocorrer num daqueles vislumbres raros, surge sem o sentimento que movera o
pedido, fosse de misericórdia, fosse de gratidão, e as palavras solenes, como
quem conversa com respeito com o sagrado, se dão apenas como palavras que não
têm interlocutor, vazias que são de humanidade e sofrimento solidário para com
o que sofre. Porque oração é relacionamento com o humano, não é mágica que abre
portas dos milagres, é ação humanizadora que muda mais quem ora do que o
favorecido, que retorna aos ouvidos do piedoso, para que escute a si mesmo como
se fosse um outro lhe dizendo da dor e do compadecimento. Você pode olhar as
orações de Jesus e ver nelas os milagres. Tem muita gente que olha para as
mesmas orações e vê nelas a profundidade do amor em movimento para o outro, o
que faz dele ser mais humano do que a maioria dos estudiosos gostaria que fosse,
e o coloca no chão diante da vida e da miséria, imediata e existencial.
O vamos orar irônico, nem merece frase de conclusão de texto.
Natanael Gabriel da Silva
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