sábado, 16 de novembro de 2013

E QUEM PRECISA DE MILAGRE?



Seja, porém, o vosso falar: Sim, sim; não, não, porque o que passa disso é de procedência maligna. – Mateus 5.37

“Acredito, porque um filho não vai mentir pra mãe!” – foi a sentença, quase uma clarividência profética, que encerrou a nossa conversa matinal num sábado de sol. Minha mãe e eu conversávamos sobre filhos e o assunto migrou para o bem-estar que ela sentia quando, madrugadas adentro, ficava perguntando como estariam as suas sete crias e, ao mesmo tempo, descansava: - “Está tudo bem!”, os filhos diziam. Então eu continuei: - “Escuta isso, mas não acredita”, daí ela me deu a lição dos seus oitenta e seis anos vividos desde o tempo da revolução de 32 e sua fuga numa madrugada de São João da Boa Vista, do tempo da lavoura e do pai que morreu cedo, e eu já vivi mais do que ele, do tempo quando passava as madrugadas pensando o que colocaria à mesa pra saciar a boca dos sete, do tempo quando fazia roupas de saco de farinha e de açúcar e as tingia na cor que o uniforme escolar exigia, do quando só tinha um vestido que o lavava à noite enquanto os pequenos dormiam, do quando voltava da entrega do bordado a encontrar-se com os dois, os pequenos dos pequenos, já à porta da padaria à espera do pão que tinha sumido da mesa.

Então o “Acredito, porque um filho não vai mentir pra sua mãe!” veio acompanhado, cheio de tudo o que poderia ser mais gratificante e realizador, o sentimento de que valeu a pena, e por conta do acredito, chegaram o descanso e o sono, na trilha do realizado, da vida que agora se esgota e que teve uma completude parcial em si mesma: não fez tudo o que precisava, mas fez tudo o que deveria ter sido feito.

Não foi um “acredito” como se esperasse um milagre, claro que não. Também não foi um “acredito” politicamente correto, educadamente pastoral. Isso também não. Por um lado foi um acredito pós-empenho, pós-esforço, pós-dedicação, um “acredito” no plural e no superlativo e que não tinha por natureza agradar quem quer que fosse, mas satisfez o próprio coração, que descansou agasalhado pela confiança. Um acredito que transfere ao outro a responsabilidade da ética, da autenticidade e da transparência, mesmo que se torne vítima dele.

Sai de casa naquela manhã de sábado com a memória da fé que está no passado, não da que reside no futuro. A fé por conta do que passou tem a cor da simplicidade e traz o merecido descanso e uma incompreensível paz. Trata-se da fé no que aconteceu, ou um acredito por conta de um princípio, fundamentado tão somente na ingenuidade. Não espera um milagre, nem é crítico em relação à resposta, mas é o suficiente pra fazer sorrir e descansar, mesmo que seja na madrugada.

E daí? Quem precisa de milagre?

Natanael Gabriel da Silva

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