quarta-feira, 6 de maio de 2015

A JOVEM VIRGEM E A IDOSA ESTÉRIL



Ouvindo esta a saudação de Maria, a criança lhe estremeceu no ventre; então, Isabel ficou possuída do Espírito Santo. E exclamou em alta voz: Bendita és tu entre as mulheres, e bendito o fruto do teu ventre!  E de onde me provém que me venha visitar a mãe do meu Senhor? – Lucas 1.41-43

É claro que é o poder da vida que as uniu, o que na história ficou conhecido como o encontro do precursor com o seu Senhor, ou se preferir, de João Batista com Jesus, antes do nascimento, antes do sopro da vida prometida. Promessa que Maria foi conferir, porque não era comum anjo aparecer do nada, desde que tinha havido o tal do silêncio profético, expressão que Maria não conhecia e ficaria reservado aos estudiosos da literatura teológica; conversar com um anjo, dizia, quase não fazia sentido, e como se não bastasse o milagre da aparição celestial veio dialogada a partir do nome próprio, Maria, anunciado em alto e bom som pelo visitante inesperado. Isso aumentava a responsabilidade da ouvinte e dava ao milagre uma impossibilidade exponencial. A conversa com o anjo teve lá os seus limites, havia sido sobre uma gravidez improvável, de um filho que nasceria numa missão singular, dado numa promessa que qualquer mãe de primeira viagem gostaria de ouvir, ainda mais sendo divina: ele será grande e filho do altíssimo!

Ora, Maria questionou como deveria ser. O tal, enigmático e misterioso anjo, disse apenas da outra, da idosa, parenta de Maria, que se por acaso quisesse conferir, poderia ir ver que a estéril já estava grávida; e qual a diferença entre engravidar sendo virgem ou sendo absolutamente estéril? - (o absolutamente ficou por minha conta) A questão não era a diferença, mas a possibilidade de fazer surgir a vida do nada, coisa da especialidade de Deus, que depois do haja luz, se tornou uma prática, e os patriarcas que o digam. Então Maria foi ver o que se passava com aquela que sabia ser estéril, um pouco não acreditando, um pouco pensando na possibilidade que de fato fosse, e saiu, porque a fé é esse caminho entre o não acreditar e acreditar, e quem diz que acredita, acredita mesmo, de maneira pura e completa, exagera, não é mesmo? Pessoas normais como Maria, você e eu, vamos acreditando, um pouco sim, um pouco não, mas damos o passo na direção do sim, e um pequeno passo deste modo será sempre um passo grande, por menor que pareça ser. Maria deu o passo favorável ao sim. Foi ver a gravidez improvável, e nem bem chegou e o milagre da boca do anjo, que parecia grande, ficou pequeno, ou no mínimo menor.  Que anjo que nada, o milagre da criança agora tomava conta da cena, criança em gestação, e foi justamente o feto que conheceu, identificou e mostrou que o prometido estava chegando.  Daí você vai me dizer que isso é impossível, e onde já se viu feto ter consciência de si e da existência, quando a gente sabe que nem mesmo o recém-nascido identifica e separa o eu do mundo, que história mais estranha, porque a criança, que nem criança ainda era, fez a legitimação da promessa e do impossível. Ora isso parece fábula, e você vai me dizer que é, assim não percebe que com isso dá um passo pra trás, e na fé, um passo dado para trás será sempre um passo grande, por menor que seja. Mas, foi só um passinho! Pois é, sinto muito, na fé um passinho pra traz é um passo enorme, imenso. O que Maria viu, e ouviu, foi apenas a vida, em Isabel, legitimando a vida nela, nada mais, porque só a vida dá legitimidade à vida; esqueça a impossibilidade do feto e do feito.

Era tudo, pois, milagre. O anjo havia sido milagre. O que ele dissera, muito milagre. Depois, uma criança, que nem ainda era criança, apenas feto, se antecipava na alegria. O que se conclui disto é que a alegria vem antes do raciocínio e da inteligência, antes da confirmação e da possibilidade ou plausibilidade do discurso. Isto é, se fosse um religioso a confirmar o dito, iria procurar nos livros, agora como era feto, encontrou-o na alegria, porque esta não precisa de palavras, nem de conceitos, basta a celebração. Era, na verdade a vida, apenas vida. Vida pura e no estado de feto. Vida prometida, brotada, produzida pelo sagrado e legitimada pela própria vida, mais que a palavra do anjo, mais que as promessas dos antigos textos, e Maria que só entendia de vida, compreendeu tudo; a vida tinha vindo a ela sem conceito, completa e num corpo não formado.

Foi assim que Maria cantou orando: “A minha alma engrandece ao Senhor e o meu espírito se alegra em Deus, meu salvador.” Não poderia ser diferente: maternidade, vida, poesia e oração, são misturas da fé e do coração.

Natanael Gabriel da Silva

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